sábado, 23 de fevereiro de 2008

Leis proíbem, mas sociedade é conivente

O trabalho infantil é um problema social crônico, que aprisiona milhares de crianças e adolescentes, mantendo-os longe da escola e, principalmente, do prazer de aproveitar a infância e a juventude. Pode não parecer, mas, a cada instante, uma nova criança é obrigada a trabalhar no Brasil, e, na maioria das vezes, acha normal ajudar no “sustento” da casa.

Embora a lei brasileira classifique o trabalho infantil como aquele realizado por menores de 16 anos, e só permite que o jovem trabalhe a partir dos 14 (como aprendiz), em todas as regiões do País, quer seja no campo ou nas grandes cidades, se olharmos com cuidado, é comum ver crianças e adolescentes trabalhando, com o consentimento da sociedade. Isto por que quem constata o fato e não denuncia, se torna cúmplice dos que estão se beneficiando com o Trabalho Infantil.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) proíbe o trabalho em horário noturno - das 22h00 às 05h00 -, perigoso, insalubre, penoso, prejudicial ao desenvolvimento físico, psíquico, moral e social, para menores de 18 anos. Todavia, é comum se ver crianças vendendo balas, engraxando sapatos, trabalhando em “casa de família” e até na lavoura “ajudando na renda da família”. Existem ainda, as que são exploradas sexualmente ou envolvidas no tráfico de drogas. Quem garante o direito dessas crianças e jovens?

Na Constituição brasileira, por exemplo, existem vários dispositivos jurídicos que proclamam a obrigatoriedade de proteger os direitos da criança e do adolescente. O artigo 227 é um deles. Ele define que “é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente o direito à vida, à saúde, à alimentação entre outros, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão".

Infelizmente, essa lei não se parece em nada com a realidade que essas crianças e adolescentes vivem. A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE mostra que, em Santa Catarina, 104.000 crianças e adolescentes, com idade entre 5 à 15 anos, realizam algum tipo de trabalho. E se engana quem pensa que o trabalho infantil ajuda a criança a “tomar gosto pelo serviço”. Pelo contrário, a Organização Internacional do Trabalho (OIT), o Unicef e demais organismos nacionais e internacionais asseguram que todo e qualquer trabalho realizado por crianças de até 14 anos são prejudiciais, pois comprometem tanto seu desenvolvimento físico quanto mental.

Além disso, o trabalho exige níveis de concentração muito grandes para a criança e para o adolescente, trazendo, como conseqüência, o estresse emocional. A Assistente Social Micheline Coelho diz que o trabalho infantil não afeta somente o aspecto físico, como também aspectos psicológicos e pedagógicos da criança, a qual ainda não apresenta maturidade física, psicológica e pedagógica para exercê-lo. Levando, portanto, à desmotivação, e a desistência precoce dos estudos.

Mas, se o trabalho infantil acarreta tantos problemas, e se a educação e a convivência sadia na sociedade são direitos garantidos por lei, por que elas não estão sendo cumpridas? De quem é a responsabilidade?

- Muitos não sabem, mas a Procuradoria Regional do Trabalho é quem tem a incumbência de fazer com que as leis e a Constituição Federal sejam respeitadas, em se tratando dos direitos sociais. É ela que intervém nos processos judiciais, investiga denúncias, instaura inquéritos e propõe ações judiciais como ação Civil Pública, Civil Coletiva e etc. - afirma o advogado Luiz Antônio de Souza.

Outro órgão que atua no combate ao trabalho infantil é o Conselho Tutelar, que atua na órbita municipal, como órgão permanente e autônomo, e é encarregado de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente.

- O Conselho Tutelar é um instrumento nas mãos da comunidade, que fiscalizará e tomará providências para impedir a ocorrência de situações de risco da criança ou adolescente. O orgão desempenha e executa suas atribuições, conforme o Estatuto da criança e do adolescente - explica Micheline.

O combate ao trabalho infantil é, para o governo brasileiro, uma questão de direitos humanos. O tema está na agenda da política social do país, constituindo um desafio tanto para as instituições governamentais, quanto para a sociedade. A Procuradora do Fórum de Erradicação do Trabalho Infantil, Liane Vaz Daniel, ressalta que o trabalho infantil é uma realidade comum, os órgãos governamentais, não-governamentais e a sociedade como um todo devem preocupar-se com isso. No entanto, a responsabilidade principal da política, legislação, estratégias e ações para eliminar o trabalho infantil são uma missão governamental.

Combate

Para combater o que tem constituído tanta preocupação para o Brasil, foram criados dois programas que auxiliam na erradicação do trabalho infantil. São eles: o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e o Bolsa Família. Esses dois programas fornecem uma ajuda em dinheiro para as famílias e exigem que as crianças freqüentem regularmente à escola.

Para retirar as crianças e jovens do trabalho, o PETI desenvolve pré-oficinas

Mas, para que todos estes órgãos possam detectar e por fim erradicar o trabalho infantil, é preciso lembrar que a melhor forma de ajudar a combater é a denúncia. Toda a sociedade pode e deve delatar casos de trabalho infantil. Para isso, é necessário entrar em contato com o Conselho Tutelar da sua cidade, que encaminhará as queixas à Delegacia Regional do Trabalho, cujo papel fundamental é identificar os casos, punir quem possivelmente esteja sendo beneficiado e encaminhar as crianças e adolescentes a programas onde eles estudem, realizem pré-oficinas e pratiquem esportes, como o PETI.

Rafaela Figueira Aleixo

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